Mergulhada em sentimentos pessimistas. Pensamentos de morte em vários momentos do dia. Tudo pesa. É excessivamente pesado. Os ombros são declinados e o sorriso forçado. Tem família, não pode exibir sua tristeza vinte e quatro horas do dia, mas desejaria. Alterna momentos de forte melancolia com sorrisos amarelos para não entregar sua identidade maldita. Sofre muito com tudo isso. Chora, desespera-se quando se vê só. Não tem qualidades, ou não as enxerga, só vê defeitos e eles são muitos.
Diante do espelho, um dia desses, buscou uma conversa franca consigo mesma. Maldita hora! Esse ato só piorou sua falta de intimidade consigo mesma. Só conseguiu dizer uma frase: - Oi, sou Bertoleza. Pronto. A voz grossa e um pouco fanhosa interrompeu a tentativa de melhorar aquele relacionamento. Amaldiçoo sua voz, os dentes superiores frontais separados, o rosto assimétrico com o lado direito bem mais protuberante. Estrábica, pescoço envelhecido apesar da pouca idade, tinha 30 anos. Os cabelos eram opacos e caiam aos montes mostrando falhas enormes do couro cabeludo. O nariz grosso, olheiras profundas. Seios miúdos e caídos, estômago alto, sem cintura, barriga saliente com flacidez e uma cicatriz que ela jura não saber de onde veio, já que nunca sofreu cirurgia. Pariu feito animal seus três filhos. Braços e pernas roliços, quadril avantajado repleto de estrias. E os pés? Não precisavam ser como os de Sinhá Vitória. Pura maldade da genética! Desistiu do espelho e foi deitar-se, mastigar suas frustrações e chorar.
Texto: Rejane Abreu
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Bjs, bjs ---:*-*: ---